segunda-feira, 22 de janeiro de 2007

O meu Cristo Partido

Amig@s,

quero partilhar convosco um belo livro, muito pequeno, que li numa tarde, e do qual não resisti a tirar os excertos que vos envio… quero guardá-los sempre por perto para reler quando me for esquecendo deste Cristo Partido, Deus-menino, Deus-homem, que dá a Sua vida por cada um de nós. Envio-vos esta mensagem porque acredito neste Deus e luto para não largar a Sua mão, que Ele generosamente oferece para me amparar, todos os dias. Envio-a porque vale a pena ler este livro… oxalá o possam fazer.

Beijos,

Tchauééééééé!

Vera*

O meu Cristo Partido

Vou mostrar-vos o meu Cristo. Não é verdade que é muito belo? Mas, claro, falta-lhe o braço direito, o esquerdo está mal seguro no ombro e a mão partida por ter sido arrancada violentamente do cravo. Também lhe falta a perna direita, cortada por meio da coxa. Conserva a esquerda, mas colada à pressa e sem cuidado. E, além do mais, está sem cara. Partiram-lha totalmente. Cristo sem rosto. Cristo anónimo. Cristo fantasma. É, porém, muito belo, não é? Ainda que muito triste.

Não me restaures.

Porque não queres que te restaure? Não compreendes, Senhor, que será para mim uma constante dor ver-te partido e mutilado, cada vez que te olhar? Não compreendes que sinto dó?

É isso que quero: que vendo-me partido, te lembres de tantos irmãos que convivem contigo, ignorados e distantes, e que estão, como Eu, partidos, esmagados, indigentes, oprimidos, doentes, mutilados… Sem braços, porque não têm possibilidades nem meios de trabalho; sem pés, porque lhes bloquearam os caminhos e não podem dar um passo em frente na vida; sem cara, por que lhes roubaram a honra, o mérito, o prestígio. Todos os esquecem e lhes voltam as costas… Não me restaures! Talvez que, vendo-me assim, te sirva de lição para a dor dos demais.

Deus tem mão esquerda

E, a murros bruscos e desalmados, afastamos continuamente da nossa beira essa mão direita de Deus que, suave, calada, insinuante, dorida e paternal, tratava, adejando, de ser carícia, sorriso, voo, esperança, perfume, bálsamo e beijo na nossa vida. E Deus retira então, muitas vezes, a mão direita, Tornamo-la praticamente inútil para nós. Outras vezes, muitas – que sorte então! -, Deus não Se dá por vencido. Retira a direita, mas desprega a esquerda. Diante da mão esquerda de Deus que, quando actua, irrompe quase sempre inesperada e implacável na nossa existência, a primeira reacção é um grito de protesto, de rebeldia e desespero. Terrível, violenta, dura, implacável, mas bendita mão esquerda de Deus! A cruz é o disfarce primitivo e verdadeiro da tua mão esquerda. O acidente de trabalho, a represa rebentada, o choque de automóvel, o fracasso, o cancro… - a tua mão esquerda! – não continuam a ser cruzes onde nos crucifica a dor? A mão esquerda está mais perto do Teu coração que a direita. Naturalmente, porque só usas a esquerda com aqueles que misteriosamente e privilegiadamente o Teu coração ama.

Senhor, se não basta, para nos salvar, a ternura da Tua direita, desprega a esquerda e disfarça-a do que quiseres – fracasso, calúnia, ruína, acidente, cancro, morte… Dá-me a Tua mão, ainda que seja a esquerda, tanto faz, se for Tua. Se segurar a Tua mão, não receio fugir. Se segurares a minha, não receio perder-me. Dá-me a Tua mão, ainda que seja a esquerda.

Perdeu-se uma cruz

Não pretendas furtar-te à cruz. É inútil. Não se adquire. Nasce connosco. Para fugir da cruz, há que deixar de existir. O sono, durante o qual de certo modo deixamos de existir, liberta-nos da cruz, da dor, da angústia. Para voltarmos a existir, ao despertar, e encontrarmos de novo a cruz, mas frescos e renovados para mais uma jornada da Via-Sacra. O nosso engano é querermos despojar Cristo da Sua cruz, para vermos se assim nos livramos da nossa. Respeitemos a cruz que Cristo escolheu voluntariamente, pois Ele ama-a com desmedido amor desde toda a eternidade. Enquanto que nós não sabemos, não queremos, nem podemos, por vezes, viver com a nossa. Afinal, sabes porque é que às vezes a nossa cruz acaba por ser insuportável? É um absurdo aguentar uma cruz laica, sem sangue nem amor de Deus. Não tem sentido.

De que pé coxeia Deus?

Encontrar um bom emprego é difícil. Pelo contrário – que contraste! – encontrar Deus é bem fácil. Conseguir uma colocação bem remunerada é sorte reservada a bem poucos. Conquistar o coração de Deus, supremo e incalculável tesouro, está na mão de todos. E, sendo Deus a máxima aquisição, não precisamos, para isso, do enfadonho montão de cartas, recomendações, influências, diligências, certificados, visitas e presentes, que são prelúdio inevitável para conseguir essa colocação com que sonhamos, e quase sempre, se escapa das nossas mãos. Para chegar a Deus, há um caminho elementar e fácil. À disposição e em poder de todos. De eficácia infalível. Os pés partidos de um Cristo pregado na cruz. Aqui está o ponto fraco de Deus. Deus coxeia dos Seus dois pés pregados! Que os nossos lábios sigam a direcção dos cravos, que se tornem flechas de beijos sobre os pés de um Cristo Crucificado! Beijo a beijo, venceremos Deus. Conquistá-lo-emos. Cristo tem os pés pregados, não para serem beijados pelos anjos que, por estarem tão altos, não chegam até eles. Cristo espera o beijo dos pecadores, já que por nós e só por nós está na cruz.

Quem te partiu a cara?

Pensais que sempre e a toda a hora consigo imaginar os olhos do meu Cristo Partido, na Sua cabeça mutilada? Nem sempre, garanto-vos. O normal é a luta estéril e a desilusão impotente. Procuro contemplá-lo com toda a lama acumulada nas pupilas e só vejo madeira em vez de rosto. Madeira impenetrável na qual fazem ricochete os meus olhares. Confesso-vos, amigos: então protesto, queixo-me e revolto-me, enfrento Deus e grito-lhe: Por que não Te deixas ver, Senhor? Porque me condenas a servir-Te nas trevas? Pareces um Deus cego, insensível, surdo e mudo. Faço-Te perguntas e não respondes. Falo-Te e nem sequer sei se me escutas. Protesto e permaneces hermético. Peço-Te de joelhos que me fites, que me mostres os Teus olhos, mas em vão. Como se fosses cego! Se me fitasses uma só vez, se conseguisse ver os Teus olhos, ainda que apenas por uma fracção de segundo, sei que passaria a ser bom, bom deveras e para sempre. Nunca voltaria a ser mau, nunca… não queres que eu seja bom? Pois então olha para mim, Cristo, olha para mim!

- Bem olho para ti. Olho para ti, não afasto os meus olhos da tua vida. Que seria de ti se deixasse de te fitar? Olho-te, ainda que não vejas que te olho. Os meus olhos vêem-te, embora não os vejas. É esse o mérito da fé: avançar para Mim de noite, tacteando nas sombras, solicitando respostas que não chegam, estendendo umas mãos frustradas que nunca alcançam nada. Segue, filho, pela noite da fé até que, um dia, por recompensa, vejas a cara de Deus.

Quantas horas não terei gasto a pôr caras ao meu Cristo Partido? Não sei. Nunca mais acabo. Revejo os cantos de velhos museus esquecidos. Relembro-me com alegria de mais pintores, de novos retratos, de perdidas esculturas, que a minha memória descobre com esforço.

- Basta! Não me ponhas mais caras. Tolerei o teu jogo demasiado tempo. Esperava, calado, a ver se tu próprio chegavas a compreender que não era do meu agrado o que supunhas uma desafronta e um consolo. Aflige-te ver-me como estou. E constróis com a tua imaginação belos rostos mentirosos que interpões entre os teus olhos e a Minha cara cortada de um golpe. Não consegues aceitar a verdade, sem atenuantes, da minha Paixão. Basta! Aceita-me assim partido, ou então joga outro jogo comigo… não tens por aí um retrato do teu inimigo? Do que te inveja e não te deixa viver? Do que, deturpa todas as coisas? Do que sempre diz mal de ti? Do que te despreza, arruinou, deu más e decisivas informações de ti, amigo traidor?… do que conseguiu afastar-te do teu emprego, vilmente te caluniou, malogrou os teus planos, te persegue sempre, jamais te perdoa?... do que meteu na prisão o teu irmão, o que aproveitou a guerra e matou o teu pai?... Já reparaste na cara dos leprosos, dos anormais, dos idiotas, dos mendigos sujos e malcheirosos, dos imbecis, dos loucos, dos que se babam?... E ainda a cara do blasfemo, do suicida, do criminoso, do traidor, do vicioso, da prostituta… Necessito que ponhas essas caras sobre a minha. Admiras-te que os tolere e queira sobre a Minha cara? Mas não vês que os trago no coração, que é mais, infinitamente mais que trazê-los sobre o rosto? Não vês que dei a vida por todos? Por todos, ouves? Por todos! O que mais me decepciona é que te escandalizes. Que te assustes. Que longe estás de mim, então! Quando me compreenderás? Que sabes tu dos Meus planos? Que sabes dos Meus projectos sobre as almas? Que poderás entender das infinitas loucuras do Meu Amor?

Compreendes agora o que foi a Minha Redenção? Adivinhas a loucura do Meu Amor, que foi capaz de dar a cara por todos vós?

Retirado de "O meu Cristo Partido" de Ramón Cué, da Editorial Perpétuo Socorro

3 comentários:

Anónimo disse...

Olá
ontem à noite em s.Bartolomeu de Messines, algarve, após teatralização de imitação de cristo de tomás de kemps, o pároco local dissertou tendo como base o meu cristo partido.
que actualidade profunda!!

manuel

Anónimo disse...

olá!

Encontrei o teu blog por acaso... e por acaso encontro passagens de um dos meus livros favoritos!!! Já li o "O meu Cristo Partido" umas 3 vezes e cada vez que leio descubro sempre algo novo, algo a aprender!
Também já li o meu Cristo Partido de casa em casa e é igualmente extrordinario... um Cristo motilado, mas rebelde, que se dá todo aos outros e nos leva a querer ir com ele ao encontro dos que mais precisam... bem haja quem divulga a existencia deste "Cristo Partido" que fala aos jovens atraves de um livro e nos toca no mais profundo do coraçao!

Um forte Abraço
Sofia Tomé (Vila Real)

Ely Alves de Paula disse...

Parabens por esta publicação.
Conheço os dois livros do Pe. Ramom:
Meu Cristo partido e meu Cristo partido de casa em casa.
é um preciosidade!
O texto que mais me tocou, foi "O Rosto De Deus" . Fiz questão de colocá-lo como uma pagina no livro "História que a vida nos contou".
Fico feliz por encontrar alguem que ainda tem a coragem de falar do amor e da misericordia de Deus, para que o mundo saiba que só em Deus possamos repousar em paz.
Mais uma vez obrigado.
Ely Alves de Paula - MG